Notícias

Porque está a subir o preço dos pellets?

O preço médio dos pellets aumentou 150% em apenas seis meses. O aumento da fatura energética e a elevada procura poderão explicar a subida. Com o inverno à porta, poderão os consumidores continuar a contar com esta solução para se aquecerem?

10 outubro 2022 Arquivado
salamandra a pellets

iStock

Os pellets de madeira, produzidos a partir de restos de folhas, serradura e lascas de madeira, têm sido apontados como uma alternativa económica e com menos impactos ambientais para o aquecimento da casa. Contudo, nos últimos seis meses, o preço médio deste produto já aumentou 150%, em Portugal. Se no início do ano era possível comprar um saco de 15 quilos por cerca de 4 euros, atualmente, as superfícies de retalho que já têm stocks de pellets para vender estão a praticar preços entre os 8,99 euros e os 10,99 euros.

O problema é transversal a vários países europeus. Em Espanha, por exemplo, o preço dos pellets subiu 67% desde o outono do ano passado. Para conter os preços da energia pagos pelo consumidor, o Governo espanhol anunciou já uma diminuição do IVA de 23% para 5% em produtos como pellets, lenha ou outros utilizados para aquecimento. No Reino Unido, onde 40% dos pellets com certificação ENPlus utilizados eram provenientes da Rússia e da Bielorrússia, este requisito de qualidade foi suspenso temporariamente para garantir o abastecimento do país a partir de outras origens. Já na Alemanha, os preços da lenha e dos pellets de madeira subiram 85,7% em agosto face ao período homólogo, de acordo com o Destatis, departamento federal de estatística alemão.

A crescente procura em toda a Europa nos últimos meses pode explicar a abrupta subida dos preços. Com o inverno à porta e problemas de continuidade no abastecimento de gás natural proveniente da Rússia, que está a ter como consequência um elevado incremento no preço da energia, os consumidores europeus estão a procurar alternativas para o aquecimento das suas casas. No entanto, a oferta disponível no mercado poderá não ser suficiente, uma vez que as importações de pellets de madeira provenientes da Rússia e da Bielorrússia estão proibidas. Além disso, os custos de produção deste produto estão a subir, estimando-se que, atualmente, a eletricidade represente já cerca de 19% dos custos totais de produção dos pellets, de acordo com dados da associação AEFFECC, que representa o setor em Espanha, citados pela OCU, organização de defesa dos consumidores daquele país. Em Portugal, onde os industriais se deparam com constrangimentos similares, podemos ter um fenómeno idêntico, com o setor a refletir o aumento dos seus custos nos preços de venda ao consumidor.

Segundo o barómetro anual sobre a indústria dos pellets em Portugal, publicado pela organização não-governamental Zero pela primeira vez este ano, estima-se que o País tenha produzido cerca de 815 mil toneladas de pellets de madeira em 2021. Destas, 510 mil toneladas terão sido exportadas. Com a União Europeia a proibir as importações de pellets de madeira provenientes da Rússia, as exportações nacionais deste produto para países europeus poderão aumentar.

Contactámos a Associação das Indústrias de Madeira e Mobiliário de Portugal (AIMMP), que representa, entre outras indústrias, os produtores de pellets em Portugal, mas até à data de publicação deste artigo não foi possível obter uma resposta às nossas questões.

Empresa do setor culpa "carência energética" da Europa

Entre os produtores de pellets de madeira há quem diga que a situação é “desesperante”. Eduardo Ferreira é dono da Vimasol, empresa que fabrica pellets em Guimarães, e não tem dúvidas de que os preços elevados vão manter-se durante mais algum tempo, mas assegura que o problema não se limita ao mercado nacional.

De acordo com o empresário, o problema começou com o fecho do gasoduto Magrebe-Europa, que servia a Península Ibérica, em 2021. A invasão da Ucrânia pela Rússia, em fevereiro deste ano, veio criar ainda mais pressão, e os comercializadores de eletricidade e gás já anunciaram que os próximos meses serão de aumentos. “Existe uma conjuntura europeia que está a contribuir para o aumento dos preços. É terrível. Ainda antes da guerra já estávamos muito mal em Portugal”, afirma. O produtor de pellets explica que, assim que os preços do gás natural começaram a aumentar, no ano passado, várias indústrias nacionais, como a têxtil, começaram a recorrer a caldeiras de biomassa e a pellets para reduzir a fatura energética das suas operações. O aumento da procura provocou logo uma subida nos preços da matéria-prima.

“A carência energética que existe neste momento em toda a Europa é o principal problema. Antes da guerra, de forma a viabilizarem o seu negócio e manterem os custos controlados, as indústrias começaram a consumir biomassa. Quando rebentou a guerra na Ucrânia, a situação piorou porque as fábricas de pellets da Europa de Leste deixaram de fornecer a Europa Central. Com tudo isto, os maiores consumidores de pellets no setor doméstico, como a Itália e a França, e até a Alemanha, começaram a procurar pellets em Portugal. Alguns destes já compravam a Portugal, mas não como está acontecer agora”, revela Eduardo Ferreira.

A escassez, garante, não existe apenas em Portugal. “Se à procura internacional juntarmos o mercado doméstico, que só surge na altura do inverno, criamos um problema: a procura é muito superior à oferta. Não há pellets e há uma procura enorme. Há empresas nacionais que não só venderam para a indústria como começaram a fazer contratos com empresas internacionais. Quem não tem um contrato não vai conseguir comprar. É um desespero. Todos os dias recebo dezenas de e-mails, alguns nacionais, mas, sobretudo, internacionais, a perguntar se temos pellets para vender e a pedir 50 camiões, 100 camiões... Não é um problema nacional”, acrescenta.

O preço da matéria-prima para a produção de pellets é outro dos problemas. Segundo o produtor de Guimarães, há neste momento uma forte concorrência pela madeira de pinho em Portugal. “Como há falta, a madeira de pinho é vendida em leilões da floresta a preços muito mais altos. Antes era vendida a 40 ou 50 euros a tonelada e neste momento é vendida a 100 euros (...). Ou pagamos ou não temos matéria-prima. E além da matéria-prima, que subiu, os custos energéticos também subiram bastante. Neste momento estou a produzir pellets sem saber qual o custo real”, explica ainda.

Perante este cenário, o produtor de pellets teme que este seja um inverno muito difícil para as famílias portuguesas, mas acredita que o mercado voltará a equilibrar-se. “Havia uma quantidade de consumo, mas os parâmetros mudaram. No entanto, as pessoas têm cada vez menos rendimentos, e os preços estão a aumentar. O que vão fazer as famílias numa situação de precariedade? Não vão deixar de comer, mas vão deixar de aquecer a casa, e o mercado vai acabar por se equilibrar. Tenho noção de que há pessoas que não vão ter condições de aquecer as suas casas”, conclui.

Ainda que possamos admitir que parte deste problema tem uma explicação conjuntural, dado o impacto que esta situação cria na vida do consumidor, a DECO PROTESTE enviou um pedido de esclarecimento à Autoridade de Segurança Alimentar e Económica (ASAE) para que esta averigue se existe especulação de preços por parte da indústria de pellets. Até à data de publicação deste artigo não nos foi possível obter uma resposta.

Salamandras a pellets continuam a ser opção económica

Embora os preços dos pellets estejam em rota ascendente, as salamandras a pellets continuam, ainda assim, a ser uma opção económica para o aquecimento da casa, ainda que este sistema possa não ser o ideal para todos os tipos de habitações, já que é necessária a colocação de uma chaminé no exterior.

Considerando que um saco de 15 quilos de pellets custa, atualmente, cerca de 10 euros, podemos assumir que o preço por quilowatt-hora (kWh) rondará os 13 cêntimos. Este valor continua a ser inferior aos 19 cêntimos por quilowatt-hora da eletricidade.

Custos anuais com energia e emissões de CO2 de três equipamentos

Assumimos, como ponto de partida, a utilização de um termoventilador durante quatro horas por dia. Estabelecemos que a quantidade de calor fornecida por este equipamento corresponde às necessidades de energia útil para aquecimento ambiente. Comparámos os consumos e os respetivos custos com energia de outros equipamentos para dar resposta às mesmas necessidades. 

Para fazer face a estas necessidades de aquecimento, serão necessários cerca de 17 sacos de pellets de 15 quilos. Os nossos cálculos mostram que, mesmo com o aumento do preço dos pellets, o aquecimento com recurso a uma salamandra que utiliza esta fonte de energia continua a ser uma opção mais económica do que a utilização de um aparelho elétrico pouco eficiente. Além disso, é menos prejudicial para o ambiente, uma vez que se considera que a sua combustão tem emissões neutras: o CO2 libertado na queima é recuperado pelas árvores durante o seu ciclo de vida.

Para saber qual o sistema de aquecimento mais adequado para a sua casa, use o nosso simulador.

Simular melhor sistema de aquecimento

 

O conteúdo deste artigo pode ser reproduzido para fins não-comerciais com o consentimento expresso da DECO PROTeste, com indicação da fonte e ligação para esta página. Ver Termos e Condições.